André Iizuka: O fim da advocacia

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Publicado no DCI em 05/04/2013 – 00h00 0

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Em 2007, escrevi um artigo denominado de “Fim da Advocacia em 100 anos. Utopia ou destino inevitável?”, na época uma afirmação feita pelo professor de Direito do Gresham College, na Inglaterra, e conselheiro de Tecnologia da Informação do Lord Chief Justice (principal autoridade judicial do país), Richard Susskind, chocou todo o meio jurídico mundial ao afirmar que a tecnologia e a mercantilização da função tornarão os advogados cada vez menos necessários, e que a profissão como a conhecemos hoje está ameaçada de extinção, ou, pelo menos, “à beira de uma transformação fundamental”.

Essas revelações foram feitas no livro chamado The End of Lawyers? (O Fim dos Advogados?) e defendia que a mudança se dará por dois fatores: a expansão da tecnologia da informação, que permitirá a qualquer bom leitor entender os meandros da lei, e a mercantilização da profissão, que fará com que a preparação das peças jurídicas seja terceirizada para mão de obra mais barata.

Foram chamados aqui no Brasil para opinar na época membros da mais alta Corte do Judiciário, bem como famosos juristas das mais diversas áreas do Direito, e a maioria discordou total ou parcialmente dessa conclusão futura, sob os argumentos de que o advogado é indispensável à Justiça, o Direito é técnico, social e complexo, mas, com tendência das constituições de todos os países no mundo de serem mais homogêneas, a sociedade sempre necessitará de serviços de consultoria jurídica, enquanto existirem conflitos haverá necessidade do papel do advogado, entre outros.

Atualmente, vivemos na Era da Informação, temos à disposição um verdadeiro arsenal bibliográfico na Internet. As rádios, emissoras de televisão, jornais, revistas, os meios de comunicação em geral, têm levado à sociedade maior conscientização de seus direitos, das normas, dos julgados, a ponto de muitas pessoas sem formação jurídica, e às vezes até sem instrução educacional, discutirem o posicionamento de tribunais e o impacto na sociedade.

Hoje, o empresariado busca conhecer as leis, normas e princípios, até às vezes de forma autodidática, para preservar a empresa, ou ainda ter maior vantagem competitiva. É comum encontrarmos pequenas e médias organizações, em que o próprio sócio analisa contratos, faz negociação de cláusulas, estipula condições com base em modelos padronizados, e em alguns casos, chegam até a consultar as leis e os códigos para dar maior validade jurídica, sem contar quando os contabilistas, administradores, economistas, auxiliam-no na formalização, muito embora isto seja prática de grande risco por falta de base jurídica na interpretação das normas, e da jurisprudência, mas é comum encontrar empresários que conhecem mais do que muitos advogados.

Até mesmo as universidades estão incluindo no quadro de cursos de Administração, Economia, Contabilidade, entre outros, matérias de Direito, para ter um conhecimento multidisciplinar das leis, a fim de preparar futuros profissionais para a carreira executiva. Nesse sentido, em 17 de fevereiro de 2006, foi editada a Lei n. 11.280, que veio disciplinar a utilização de meios eletrônicos nos atos processuais no Poder Judiciário com o fim de assegurar sua autenticidade, integridade e validade jurídica. Na época, fiz um exercício de futurologia, imaginando um software de acesso aos tribunais, em que o cidadão que deseja ingressar com ação judicial responde a questionário simples e automatizado em que se elabora a petição inicial, colhe já a exposição dos fatos por meio de gravação e remete ao juiz eletrônico. Cinco anos depois que escrevi o artigo, os advogados estão vivenciando agora a obrigatoriedade dos processos digitais, obrigando-os a enviar petições por meio eletrônico, por meio de certificado digital do próprio advogado, não sendo mais aceito o formato em papel.

Conforme estabelecido pela Resolução n. 551/2011, a partir de 07/11/2011, os Foros Digitais somente recebem petições iniciais e intermediárias por meio de peticionamento eletrônico. Entretanto, desde outubro de 2012 as associações e entidades de classe da advocacia assistiram a uma verdadeira guerra com o Tribunal de Justiça de São Paulo, ao implementar, no final do ano, o maior fórum do Estado de São Paulo, o Central, com mais de 42 Varas, e ainda com o objetivo de curto prazo de tornar cerca de 80% de todo o estado em fóruns digitais.

O plano e a meta do Tribunal de Justiça de São Paulo são tão ambiciosos que os diretores de cartório estão tirando pessoas do atendimento em balcão para fazer a digitalização dos processos para torná-los on-line. Em breve, tudo será digital, o que permitirá que o Judiciário tenha uma base de informação gigante que eliminará cada vez mais a necessidade de trabalhos de mero expediente, de digitação, e de atendimento de advogados e estagiários no balcão para se ter cópia dos processos. Ganha o Judiciário, a Advocacia e principalmente o cidadão.

Sabe-se que este é somente o início da revolução da Advocacia e do Poder Judiciário. Já existem atualmente tecnologias em outros países que permitem a gravação em áudio e vídeo das audiências e que ficam a disposição das partes envolvidas para acesso na Internet, dispensando a transcrição de depoimentos, e ainda permitindo os advogados e juízes de fazer apontamentos, anotações e comentários que ficam a disposição particular ou privativa ao julgador.

Dizem os visionários da tecnologia que o futuro será em vídeo, dispensando ainda extensas páginas de processos para a definição das causas, e é bem provável que os advogados e os cidadãos devam ter maior preparo e cuidado na comunicação do que na escrita, entendendo a forma de interagir com a Justiça.

Tudo isto vai revolucionar e trazer celeridade, transparência e necessidade de profissionais mais qualificados no trato com o Judiciário, caso contrário haverá erros de interpretação no julgamento das causas. Quando se discute a súmula vinculante e a repercussão geral, o Judiciário está buscando unificar entendimento – e, por que não dizer, automatizar os processos judiciais de forma a tornar mais célere a entrega da prestação jurisdicional, com base em certos critérios estabelecidos pela Alta Corte. Se juntarmos a Era da Informação conjugada com a aproximação do Poder Judiciário ao cidadão comum, somada à tecnologia e à evolução legislativa, a premonição do fim da advocacia pode se concretizar. Nesse mix, a resolução dos conflitos exigirá maior conhecimento humanístico por parte dos magistrados e dos árbitros nas Câmaras, para mitigar eventuais desvios interpretativos e de realidade social.

Diante dessas reflexões, vale a pena repensar os caminhos da Advocacia e do Poder Judiciário, que às vezes decepciona, aos olhos do cidadão, mas também traz excelentes casos de justiça social para a sociedade, e acompanhar constantemente as tendências ciente de que o impossível pode se tornar possível, e o homem estará em constante evolução tecnológica em benefício da praticidade e do bem-estar.

André Sussumu Iizuka é sócio da Iizuka Advocacia